segunda-feira, 15 de junho de 2009

Todos somos responsáveis



Uma das vezes que apareci na televisão, o repórter insistiu para que eu fosse filmada encenando estar envolvida em alguma atividade ou simplesmente contemplando o nada com olhar taciturno. Palhaçada! Não topei, ele ficou nervoso, não entendia como eu podia me negar a seguir o script sugerido por ele. Eu disse, se quiser me filmar enquanto faço algo de verdade, ok, mas não vou fazer nenhuma cena. Até porque ao tentar caí na gargalhada diante da artificialidade da idéia. Eu não fiz, mas muitos fazem, arrisco dizer a maioria o faz. Vemos diariamente cientistas olhando o nada em seus microscópios, psicólogos folheando livros em suas bibliotecas de livors nunca lidos, atletas olhando o horizonte como se avistassem o futuro e o sucesso de suas conquistas. Talvez estes entrevistados sejam melhores atores do que eu, pois algumas vezes até fica bonita a imagem. Mas o que eu quero trazer a discussão com este post é a co-responsabilidade de todos nós com a performance daqueles que fazem televisão, especialmente quando dividimos com estes a cena. Um bom exemplo de como os interlocutores podem interferir na construção do discurso é o redimensionamento que os militares responsáveis pelas notícias da queda do avião Air France obrigaram os jornalistas-abutres a darem ás suas falas. No início, as notícias misturavam especulação com informações oficiais. Mas os militares responsáveis pela comunicação dos fatos corrigiam os profissionais da comunicação ao vivo, dizendo "não, nós não trabalhamos com hipóteses", "não, isso é especulação", "não, a aeronática não tem informaçõe suficientes para fazer esta declaração", "não, isso não foi dito pela aeronática". Ao realizarem seu trabalho os militares deram ainda uma lição de dignidade e respeito aos mortos e seus familiares, revelando que isto estaria acima da possibilidade sedutora de alcançar elevados índices de audiência, ao não revelarem informações que nos levassem a imaginar a tragédia da morte. Ou os repórteres cuidavam das palavras que usavam em suas previsíves perguntas, ou corriam o risco de fazer papel de bobo em rede nacional. Os militares obrigaram jornalistas a assumirem uma postura mais respeitosa e cautelosa ao noticiarem o acidente, simplesmente respondendo com firmeza e rejeitando certas abordagens. Entendo que aparecer na televisão seja um acontecimento e tanto para a maioria de nós mortais, mas espanta-me que o sujeito-entrevistado perca o senso crítico ao colocar-se diante de uma câmera. Espanta-me mais ainda que os responsáveis pela comunicação não se cansem de usar as mesmas receitas de produção de imagem rotas e previsívies desde que a televisão é televisão!

Imagem Louvre, 2009

Nenhum comentário:

Postar um comentário